04.nov

Crise financeira exclui punição por sonegação de contribuição previdenciária, diz TRF-4

Dono de empresa assolada por crise econômica não comete crime se deixa de recolher tributos ao fisco federal. Afinal, as graves dificuldades financeiras enfrentadas pela pessoa jurídica para cumprir suas obrigações tributárias podem ser consideradas causa excludente de culpabilidade por inexigibilidade de conduta diversa, desde que comprovadas pela defesa.

Com este fundamento, a 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região reformou sentença que condenou um empresário paranaense, por crimes conexos de sonegação tributária, a quatro anos e oito meses de reclusão. Por unanimidade, os desembargadores entenderam que é possível abrandar a tese de que não se aplica ao crime de sonegação a tese de dificuldades financeiras, dado o elemento fraude na sua perpetração.

“Presente, assim, situação que afasta a culpabilidade em razão da inexigibilidade de conduta diversa, de sorte que absolvo o acusado da prática do crime único de sonegação de contribuições, previsto no art. 337-A, inc. I, do Código Penal, com fundamento no art. 386, inc. VI, do Código de Processo Penal”, registrou o acórdão.

Uma denúncia, três crimes
O empresário foi denunciado pelo Ministério Público Federal por dois crimes tipificados no Código Penal: apropriação indébita previdenciária (artigo 168-A, parágrafo 1º, inciso I) e sonegação de contribuições previdenciárias (artigo 337-A, incisos I e III); e um crime contra a ordem tributária, tipificado no artigo 1°, inciso II, da Lei 8.137/90 – supressão de contribuição social para terceiros mediante omissão em livros fiscais.

Conforme a inicial acusatória, os delitos ocorreram entre setembro de 2011 e dezembro de 2013. Segundo cálculos da Receita Federal, feitos em julho de 2014, a soma de tributos não recolhidos ao fisco federal chegava a R$ 18,7 milhões.

Em combate à sentença condenatória, a defesa do empresário, alegou a existência de crime único em relação aos crimes de sonegação de contribuição previdenciária e contribuição destinada a terceiros. Com isso, pediu a absolvição do empresário no tocante aos demais crimes, sustentando a inexigibilidade de conduta diversa, em virtude de dificuldades financeiras.

Para o relator da Apelação Criminal, desembargador João Pedro Gebran Neto, a defesa produziu provas suficientes dos graves problemas enfrentados pela empresa, a ponto de não se poder exigir do acusado outra conduta. “Além da redução do quadro de empregados durante o período de crise tanto da matriz quanto da filial, a prova documental contemporânea aos fatos demonstra a existência de execuções fiscais de expressivo montante, assunção de empréstimo de valor igualmente elevado acordo com o BRDE para pagamento de dívida de mais de doze milhões de reais e aproximadamente quarenta reclamatórias trabalhistas”, exemplificou.

Gebran destacou o depoimento do encarregado do setor financeiro, que corroborou a tese da defesa, mostrando que, diante das dificuldades, a empresa priorizou o pagamento de funcionários, da energia elétrica e dos fornecedores, para evitar fechar as portas. “A situação evidenciada, assim, demonstra ser crível a existência de condições anormais suportadas pela sociedade empresarial e que lhe retiraram a possibilidade de honrar todos os débitos, impondo-se o reconhecimento da excludente de culpabilidade da inexigibilidade de conduta diversa.”

Tese abrandada
No voto, Gebran disse não desconhecer o entendimento sobre a inaplicabilidade da tese de dificuldade financeira como causa para exclusão de culpabilidade nos crimes de sonegação, tendo em vista a presença do elemento fraude. Entretanto, pontuou, tal posicionamento já foi abrandado em outros julgados da turma, citando o desfecho de duas Apelações Criminais: acórdãos 5000731-88.2012.404.7000, de julho de 2014, e 0030044-49.2007.404.7100, de fevereiro de 2015.

“Trata-se, evidentemente, de questão complexa, que exige um exame cauteloso das circunstâncias que envolvem o caso concreto. Dito isso, após tal análise, vislumbro a possibilidade de reconhecer a excludente de culpabilidade não somente em razão das provas trazidas pela defesa, mas especialmente porque não empregada fraude elaborada e sofisticada, afinal, a constatação da omissão de fatos geradores se deu a partir do cotejo entre a folha de pagamento fornecida pela empresa e as GFIPs”, concluiu.

Fonte: ConJur